Sexta-feira, 31 de Março de 2006

A Porta

Pela mão da minha colega Rita, mais velha do que eu, talvez dois ou três anos, na altura eu teria oito anos e andava na terceira classe, cheguei àquela grande porta, ainda fechada... A Rita, como sempre, falava pelos cotovelos mas eu mantinha-me em respeitoso silêncio como se alguma coisa digna de se conservar na memória estivesse para acontecer. Passado algum tempo, aparece ao fundo da rua uma senhora de baixa estatura, óculos pequeninos e um ar de infundir respeito...
- É aquela senhora! - diz a Rita.
- ... - continua o meu silêncio.
A senhora chega perto da grande porta do edifício antigo, e é também com uma grande chave que a abre fazendo soar um ruído singular e entra... Nós entramos a seguir e aos meus olhos apresentam-se umas escadas largas de pedra, a senhora vai subindo e ligando a iluminação, nós sempre atras a uma ligeira distância, eu, com a respiração entrecortada...
Ao cimo das escadas transpomos uma entrada para uma sala enorme! Sinto um odor que nunca mais esquecerei, os meus olhos ficam ainda maiores tornando-se solidários com a minha boca aberta de espanto! E este cheiro! Não desagradável, mas novo para mim. Fico imobilizada. A Rita habituada a estas lidas dá-me a mão da sua desinibição e diz-me:
- Tens de fazer a inscrição, eu ensino-te a preencher a tua ficha e o teu cartão, a D. Perpetua faz o resto.
Completada a inscrição fico parada à espera do que vem a seguir. E aquele cheiro inebriante...
- Vamos escolhe-los, vamos começar por aqui! - diz a minha companheira de aventura.
E eu saio do meu hipnotismo e começo a escolher, a escolher, já tenho os meus braços magricelas envolvendo um peso enorme.
- Ei! Não podes levar tantos. Só podemos levar até seis...
Ai e agora para selecciona-los, se eles me parecem todos bons? Lá terá de ser este, este, este, este, este e este!
- Agora é só preencher o cartão com os números e as letras que estão aí atrás, faz assim como eu, assina e põe o teu nº de inscrição.
E pronto, missão cumprida!
Vou andando de extremo a extremo da cidade, abraçada ao Noddy, ao Pequenu, ao Pássaro azul, aos Cinco, às Meninas Exemplares e às Mulherzinhas!
A sensação que eu descobri ao ler os meus primeiros livros requisitados na Biblioteca foi inexplicável. Fui leva-los muito antes de cumprir o prazo de entrega para poder trazer outros. Passado algum tempo já vinha abraçada ao Eça, Júlio Dinis, Honoré de Balzac e envolvida com os meus herois Miguel Strogoff, Ana Karenina...
E vou parar por aqui porque a saudade dos tempos idos é agridoce. Doce porque amámos aqueles vibrantes tempos inesquecíveis, agre porque não volto mais à minha Biblioteca!















Escrevinhado por gaivota da ria às 01:57
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Domingo, 19 de Março de 2006

Carta aberta

Conhecemo-nos faz algum tempo. Muitos anos até... Tem sido uma relação com altos e baixos mas sempre livre, aberta, moderna, por isso tenho-te deixado algumas vezes e enveredado por outros caminhos... Mas tenho voltado sempre e tu sempre à minha espera...
É no teu hálito quente que penetro a minha língua em recônditos paraísos de prazer.
Retenho-me na tua boca até o teu doce escorrer-me pelo meu rosto rúbeo.
A cada dia que passa descubro um sabor novo em ti. É com sofreguidão que me sacio na tua seiva e deliro no amargo que colas nos meus lábios sedentos.
Derreste-te dentro da minha boca e eu procuro ficar contigo o mais tempo possível dentro dela. Fecho os olhos num êxtase total.
Ultimamente temos passado mais tempo juntos. O prazer que tu me dás embebeda-me os sentidos e isso faz-me fraquejar...
E é num momento breve de lucidez(aparente) como este que de repente paro e vejo como a nossa relação não me leva a nenhum lado.
Vou deixar-te! Tomei essa decisão, não posso continuar nessa relação que se vai tornando cada vez mais sólida e com perigo de duradoura, quiçá definitiva.
Quero saciar-me em ti mas só quando me apetecer e deixar-te depois sem olhar para tras. Quero que esta relação volte a ser o que era: uma relação sem compromissos sérios, por isso:

Até um dia Chocolate!

(Img embebida no chocolate e retirada da Internet)

 

Não há dúvida de que o chocolate possui uma substância que, tal como a anfetamina, provoca uma sensação de felicidade e euforia, e que estimula também o cérebro, através de substâncias como a teobromina, que actua como estimulante e fortificante. Por isso é que os atletas gostam de comer chocolate, apesar do seu alto teor de calorias...(foram estas últimas, as derradeiras palavras do livro : Chocolate: Sedução Divina, (livro de receitas com chocolate) que me incitaram a tomar esta corajosa decisão)

 

(Conclusão: nem tudo o que parece é!)

Escrevinhado por gaivota da ria às 02:23
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Terça-feira, 14 de Março de 2006

Segundas-feiras...

As segundas-feiras são um bocado complicadas onde trabalho. Senão vejamos:
É à segunda-feira que toda a gente se lembra de telefonar depois de prolongada ausência, é à segunda-feira que toda a gente também se lembra de aparecer inesperadamente.
É à segunda-feira que são despejadas ideias em catapulta, são tantas as ideias inovadoras que se atropelam umas às outras e poucas sobrevivem na enchente...
É à segunda-feira que o colega Anacleto por mais tentativas que fizesse não conseguiu que o carro «pegasse» , chamou o mecânico, vai só demorar mais uma hora e meia, duas horas...
É à segunda-feira que a Rainha do Stress consegue um contágio em maior proporção. A gaivota da Ria é atingida depois de muito se debater.
É à segunda-feira que há sempre novidades nas noticias, o BCP lança OPA sobre o BPI, blá, blá, blá, passa à frente, gaivota minúscula... Ah! Esta notícia interessa-me, mas o que é que «eles» dizem? Que vão retirar a comparticipação de alguns medicamentos por estes não reunirem provas da sua eficácia???
Retirar comparticipações já é coisa a que estamos habituados, agora, retirar por falta de provas da eficácia dos mesmos fármacos, é motivo inédito.
Das duas uma, gaivota, ou a tua ignorância está a aumentar a passos largos, ou então a Gaivota-Mor tinha razão quando segunda-feira pelo final da tarde olhou para ti e disse :
- Estou preocupada com você!
- Comigo? Porquê?
- Porque começa a assumir a sua idade!
-- Porque já começou a usar os óculos. Isso desalenta-me porque eu recuso-me terminantemente a usar os meus! (Ela é mais velha do que eu 1 ano)
Sabem que mais? Adoro a minha Gaivota-Mor e apesar de esta ladaínha de segunda-feira ser uma bagatela de texto é-lhe dedicada a ela, é certo que ela muitas vezes me pega o stress da segunda-feira mas muitas vezes também consigo permanecer imunizada.
Apêndice: não posso deixar de transcrever o comentário de aflores : «E relativamente às segundas feiras, não fizeste referência aqueles que vão para o trabalho curar as mágoas dos futebois...e nós temos alguma culpa que o club dele tivesse perdido?» É que esqueci-me mesmo dessa parte que se traduz em 5 dias em que tenho de ouvir as mais acaloradas, exaltadas discussões sôbre remates, pontapés de canto, faltas, tipos de lances, etc. mas realmente a segunda-feira traz semblantes carregados, marcados pelas contusões, pelas equimoses do fim de semana futebolístico de tal maneira dolorosas que fazem esquecer tarefas laborais.(gosto deste conjunto de palavras acabado de inventar: tarefas laborais!)









Escrevinhado por gaivota da ria às 00:24
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Segunda-feira, 6 de Março de 2006

Que mudanças?

Um dia, um amigo perguntou à gaivota da ria:

- Porque não fazes um blogue?

- Um blogue? Eu? Sei que a cada momento surgem blogues mas penso que seja um mundo de letrados, ou afins, figuras que não a gaivota...

- Ora, nem todos, lá tu escreves aquilo que desejares e quando desejares, é fixolas (como ele costuma dizer)...

- Mas como devo fazer?

- Vais a blogs do Sapo e crias um.

Cá a gaivota não pensou muito, no dia seguinte, meteu mãos à obra e escreveu o 1º artigo em modo de experiência: «O que te fez aí parar?»

E pensou: isto até é facil, é interessante...foi-lhe tomando o gosto...foram aparecendo comentários simpáticos, alguns menos simpáticos mas também bem-vindos, o que escrevemos, o que dizemos, é como tudo na vida, há quem goste, há quem não goste. Foi continuando, fazendo muitas paragens, por falta de tempo às vezes, outras por um vazio da vontade...como uma vez disse: «estou mas não estou»... Foi aprendendo muitas coisas que não sabia e sentia uma alegria quase infantil quando descobria novos códigos, técnicas, dicas, etc. Nunca gostou do abismo entre bons e maus blogues, não gosta de embarcar nesse conceito e de uma coisa se orgulha: não ter nariz empinado. Desmente que o intercâmbio entre blogues é 100% impessoal, porquê? Porque se afeiçou a muitas pessoas na blogosfera, e algumas parece-lhe conhecer desde sempre...

Na nossa casa falamos, rimos, choramos, ficamos calados, quietos e suponhamos que não queremos mudar porque gostamos dela, porque guarda muito de nós, tem imagens que nós queremos preservar, e pronto, cheguei ao ponto certo : como querem que mudemos para as novas «casas Beta» e só levemos parte dos nossos pertences e os que levamos em risco de se desconjuntar?

Sensação de vazio, hoje visitei-vos, vizinhos, e não vos disse nada... já tiveram aqueles momentos em que têm algo para dizer e não conseguem articular palavra? Tenho andado arredada, vazia até, mas este anúncio de mudança até dia 1 de Maio, ainda me deixa mais vazia e com impressão de despojo, de extorsão...

Escrevinhado por gaivota da ria às 23:57
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